Apresentei uma queixa na Provedoria de Justiça contra os cortes que atingem os vencimentos dos trabalhadores do sector público, os aposentados e os reformados previstos no Orçamento do Estado de 2013.
Considero que se está perante uma crise do valor da Constituição, num momento percecionado pelos cidadãos como de grande afetação dos seus direitos.
Transcrevo em seguida o texto que enviei ao Provedor de Justiça:
“Exmo. Senhor Provedor de Justiça,
Na qualidade de cidadão reformado da Caixa Geral de Aposentações, atualmente com 61 anos de idade, venho formalmente apresentar queixa a V. Ex.ª contra o Estado português, representado pelo Governo da República, relativamente às intensões/propostas que têm vindo a ser conhecidas na comunicação social, quanto aos cortes nas reformas que dizem respeito aos aposentados, pensionistas e reformados da função pública e à minha pessoa em particular.
Está prevista no OE de 2013 a “...aplicação de uma «contribuição extraordinária de solidariedade», com natureza progressiva, às pensões de reforma mensais de valor igual ou superior a 1350€”, é a forma artificial e gravosa de tornear artificialmente a decisão do Tribunal Constitucional.
É uma redução ilegal do valor anual das pensões contratualmente atribuídas, que contraria os princípios básicos da confiança e da equidade, conforme já anteriormente afirmado pelo Tribunal Constitucional.
A minha reforma consiste da contrapartida das contribuições que entreguei ao Estado ao longo da minha carreira contributiva, de acordo com as regras por ele estabelecidas, em que o mesmo (Estado) não é o proprietário deste valor mas tão-somente o seu fiel depositário e gestor (mau gestor considero eu) da respetiva aplicação financeira. É a quebra abusiva do princípio da confiança. Confiança que aliás tenho perdido ao longo dos anos, pois que segundo o contrato que assinei no princípio da minha carreira, eu fui sempre obrigado a cumprir enquanto o Estado tem falhado sucessivamente o seu compromisso para comigo.
Está igualmente em causa o princípio da justiça, bem como a segregação socioeconómica de um grupo etário consabidamente dos mais carentes que, para além da quebra de nível de vida resultante da inflação em bens de primeira necessidade, e do exorbitante aumento de impostos, tem de suportar custos elevados com cuidados de saúde, e está em muitos casos a apoiar os seus descendentes e outros familiares, face à crise que o país atravessa.
O Senhor Primeiro-Ministro diz:
1 - que a penalização fiscal dos pensionistas resulta dos que descontaram para ter reformas, mas não estas reformas – ora os meus descontos foram aqueles que me obrigaram a fazer para ter esta minha reforma. Como cidadão celebrei um contrato com o Estado. Este contrato consistiu em que, ano após ano, e por catorze vezes em cada ano, entreguei ao Estado uma quota das minhas poupanças, para que o mesmo Estado, ao fim dos quarenta anos de descontos me devolvesse essa massa de poupança em parcelas mensais, havendo dois meses em que seria a dobrar, tal como aconteceu com os meus descontos. Deverá ter de ser assim durante o tempo em que estiver vivo, assim como em parte mais reduzida, mas tirada, da mesma massa de poupança que fiz, para a minha esposa enquanto ela viver. Esta pensão deveria ter o valor que o Estado, em determinado momento me comunicou que passava a receber (o que já não está a acontecer). Sendo assim, o Estado Português, pessoa de bem que eu julgava ser, um exemplo no seu comportamento, deveria ter de continuar a honrar esse estatuto. As pensões que correspondem aos descontos que cada qual fez durante a vida ativa nunca poderão ser consideradas excessivas. Nós os Aposentados temos de continuar a merecer o maior respeito por parte do Estado. Têm as pensões que podem ter, não aquelas que resultariam do seu arbítrio. E é este o raciocínio de pessoas honestas. Agora o Estado Português não pode deixar de honrar os compromissos assumidos com os cidadãos que, na mais completa confiança, lhe confiaram as suas poupanças e orientaram a sua vida para viver com a pensão que o Estado calculou ser a devida. Esperamos que o Estado continue sempre a entregar aquilo que corresponde à pensão que em determinado momento esse mesmo Estado, sem ser coagido, lhes comunicou que passariam a receber na sua nova condição de desligados do serviço ativo. Ou seja, a partir do momento em que era suposto não mais poderem angariar outro meio de sustento que não fosse a devolução, em fatias mensais, do que haviam confiado ao Estado para esse efeito.
2 - que a existência de pensões de aposentadoria estão acima daquilo que resulta da correta aplicação do Cálculo Atuarial aos respetivos descontos – ora, a aplicação destes princípios atuariais aos meus descontos foram legais, estando o Estado em condições de sancionar os agentes prevaricadores que lhes atribuíram pensões excessivas. Muitas dessas pensões foram atribuídas sem que os respetivos beneficiados tivessem feito os descontos suficientes. Os prevaricadores têm de ser punidos, onde quer que se situem todos quantos permitiram que, quem quer que seja, auferisse pensão desproporcionada aos descontos feitos, ou mesmo, quem sabe, sem descontos. Para além disto, para agradar não sei a quem foi emprestado dinheiro para fazer despesas faraónicas, que permitiram fazer inumeráveis fortunas e para os políticos adquirirem votos para os manter no poder. É impensável num Estado de Direito que, a pretexto dessas situações de extrema irregularidade, vão ser atingidos, a eito, todos aqueles que, do que tiraram do seu bolso durante a vida ativa, recebem do Estado a pensão que esse mesmo Estado lhes declarou ser devida. É também inadmissível que os políticos que recebem ordenados de função e que este ainda seja acrescido de benesses de vária ordem proporcionadas por essa mesma função, considerem que pensões obtidas regularmente, com valores mensais da ordem de 1.350 Euros proporcionam uma vida de luxo seja a quem for.
É neste contexto que solicito ao Senhor Provedor de Justiça que suscite a apreciação preventiva do Tribunal Constitucional sobre as matérias que mencionei. Em nome do valor primeiro da solidariedade intergeracional e para que os reformados de hoje, que em tantos casos foram o amparo dos seus ascendentes e são-no agora dos seus descendentes, não sejam vistos e tratados como «o cancro da sociedade».”
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